o ramo nomeia a sombra pretende ser uma investigação poética e visual onde os conceitos de código, criatividade, ficção e representação são continuamente transmutados. Ao observador é-lhe fornecido um lugar de experiência autónomo, alheado da realidade e uma necessidade de reorganização dos princípios da visualidade por não se encontrarem nestes trabalhos referências a uma existência no mundo natural.
Refletindo uma constelação de influências e um diálogo contínuo com o inconsciente, Ricardo Angélico concentra-se na elaboração de composições individuais com figuras imaginárias inseridas em contextos de ação muitas vezes ambíguos. Essas representações, aparentemente dissociadas do cenário global, desenham pequenas células narrativas, guiando o observador por uma rede intricada de conexões. O raciocínio subjacente não segue assim uma narrativa linear, mas sim uma abordagem combinatória, incorporando citações, distorções, dinamismo e contaminação de formas e ideias. Deste modo, a figuração no trabalho de Ricardo Angélico não nos situa apenas num espaço específico, mas também orienta e cruza eixos, absorvendo o olhar para uma infinidade de conexões mais ou menos subtis. Estes trabalhos podem ser interpretados como catálogos em constante evolução, apresentando múltiplas incidências gráficas, resultando em composições enigmáticas e desconstrutivas. Estas composições procuram transcender as classificações convencionais, promovendo uma análise das afinidades entre as figuras. É como se o artista se lançasse a fazer um trabalho incessante de recomposição do mundo, convertendo as imagens em recursos para analisar a realidade.
Catarina Leitão apresenta uma série de desenhos que hibridizam o mundo vegetal com o artificial, formando um compêndio sistematizado e organizado. Pensado como um projecto de investigação de botânica ficcional, a série reinterpreta “Systema naturae per regna tria naturae, secundum classes, ordines, genera, species, cum characteribus differentiis, synonymis, locis”, escrita por Lineu em 1735, à luz da actual predominância, quase imersiva, dos meios artificiais na realidade quotidiana. Estas obras mesclam técnicas de pintura e desenho criando analogias entre objetos técnicos e elementos vegetais no âmbito formal, onde elementos do mundo natural são adicionados ou subtraídos aos objetos técnicos. O imaginário aqui se manifesta na produção de análogos, sejam eles fruto de operações conscientes ou inconscientes, criando substitutos imaginários para a realidade.
Tendo em comum um entendimento da obra como uma janela de observação dos modos de representação e de formação do conhecimento, estes dois artistas chamam a atenção para o modo como apreendemos as coisas fora do pré-concebido. Nos trabalhos de Ricardo Angélico, para além da enunciação ser não-hierárquica, a desvinculação do sistemas convencionais abre caminho para novas interpretações e conexões.
Nesta série de Catarina Leitão, a rigidez de ordenação e de sistematização de Lineu, procedendo até à sua classificação taxionómica, contando inclusivamente com colaboração de instituições científicas, serve-lhe para proceder a uma análise crítica forçando uma operação quase absurda e irónica.Em ambos os casos, os artistas convidam-nos a reconsiderar e reimaginar outras possibilidades para o conhecimento, provocando uma reflexão crítica sobre as normas e paradigmas que moldam nossa percepção e compreensão da realidade.
Local: Casa-Museu Bissaya Barreto
(Rua da Infantaria 23, Coimbra)
o ramo nomeia a sombra pretende ser uma investigação poética e visual onde os conceitos de código, criatividade, ficção e representação são continuamente transmutados. Ao observador é-lhe fornecido um lugar de experiência autónomo, alheado da realidade e uma necessidade de reorganização dos princípios da visualidade por não se encontrarem nestes trabalhos referências a uma existência no mundo natural.